Vergílio Ferreira fotografado em 1988
| ARQUIVO DN/EDUARDO TOMÉ
Autor de Manhã Submersa e Aparição completaria hoje cem anos, se a morte
o não tivesse interrompido há quase 20.
Nada há de mais incerto do que uma data, que se quer precisa e definitiva,
que determine o "início de atividade" de um escritor. Neste domínio,
Vergílio António Ferreira, beirão nascido em Melo, Gouveia, a 28 de janeiro de
1916, não tem direito a exceção. Sabe-se, isso sim, que era estudante da
Faculdade de Letras de Coimbra, onde viria a licenciar-se em Filologia
Clássica, quando escreveu (1939) o primeiro romance, O Caminho Fica Longe, que só veria publicação quando o autor já exercia
funções docentes (1943), profissão que manteria até à reforma.
Com alguma certeza, pode dizer-se que Vergílio Ferreira ainda não
arrumara suficientemente as ideias para as sintetizar assim: "O que me
excita a escrever é o desejo de me esclarecer na posse disto que conto, o
desejo de perseguir o alarme que me violentou e ver-me através dele e vê-lo de
novo em mim, revelá-lo na própria posse, que é recuperá-lo pela evidência da
arte. Escrevo para ser, escrevo para segurar nas minhas mãos inábeis o que
fulgurou e morreu" [Nota: Todas as citações deste texto são repescadas do
livro 1000
Frases de Vergílio Ferreira,
organização de Luís Naves, edição da Quetzal]. Ou, de um jeito mais sintético:
"Escrevo para tornar visível o mistério das coisas."
De início, a escrita de Vergílio Ferreira, aparece associada ao
neorrealismo. Depois de Mudança (1949), título quase profético, os seus analistas integram-na no
Existencialismo. Não que o autor parecesse impressionado com estas
"arrumações" (apesar de mais tarde defender, em ensaio, que O
Existencialismo É Um Humanismo). A cartilha parecia ser outra: "Não, não
gosto do escritor que não arrisca nada. Que nunca joga num "pleno",
mas sempre no "par" ou no "ímpar". Não está mal; mas também
não está bem. Um livro não pode simplesmente distrair--nos. É necessário um
"saldo" final que nos comprometa com a vida. Que nos perturbe."
À luz destes princípios, de entrega sem reservas, publica três dos seus
romances mais reconhecidos, Manhã Submersa (1954),Aparição (1959) e Cântico Final (1960), com os dois primeiros a refletirem as
vivências do autor enquanto frequentou o seminário do Fundão, em cheio na
adolescência, e enquanto criança que se viu forçada a crescer longe dos pais,
partidos em nome de uma vida melhor, buscando soluções que a Beira Alta não
lhes garantia, nem a eles nem aos filhos. Talvez se radique aqui um paradoxal
desgosto com o país natal, a que não perdoa alguma pequenez e muita
mesquinhice. Escreverá, como desabafo: "Raro na vida me pensei português.
A minha pátria é a imaginação."
|notícia daqui|
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Aceda ao repositório de conteúdos da RTP que assinalam o centenário de Vergílio Ferreira.
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